Fundamentação
No ordenamento jurídico brasileiro, o dever de sustento dos filhos por pais separados é um princípio basilar, previsto tanto na Constituição Federal em seu art. 226, §5º e no Código Civil, art. 1.694 e seguintes. Esse dever, que abrange alimentação, moradia, educação, saúde e outras necessidades essenciais, permanece intacto após a separação, sendo frequentemente objeto de ações judiciais para garantir o equilíbrio entre as possibilidades dos genitores e as demandas dos menores.
Pensão alimentícia: Mais que alimentos
A pensão alimentícia, regulada pela Lei nº 5.478/68 e pelo Código Civil, não se limita à alimentação em sentido estrito. Ela engloba todas as despesas indispensáveis ao bem-estar da criança ou adolescente, incluindo a moradia. A fixação do valor ocorre com base no binômio necessidade-possibilidade, analisado caso a caso pelo juiz, que considera a condição financeira do alimentante e as demandas do alimentando.
Um questionamento recorrente no direito de família é se o genitor que paga pensão alimentícia, geralmente o pai em casos de guarda unilateral com a mãe, também deve arcar com uma parcela específica das despesas de moradia, como o aluguel, além do montante mensal já estipulado.
Moradia como parte do sustento
A jurisprudência brasileira reconhece a moradia como elemento essencial à dignidade do menor, podendo ser incluída na pensão ou tratada como obrigação complementar. Não há, contudo, uma regra fixa que determine a divisão igualitária (50%) dessas despesas, como o aluguel. O que prevalece é a análise judicial das circunstâncias concretas, como a renda de ambos os genitores e os custos reais da habitação dos filhos.
Decisão judicial na Comarca de Descalvado concede esse direito aos filhos menores
Um exemplo recente desse entendimento ocorreu na Comarca de Descalvado, interior de São Paulo. Em uma ação revisional de alimentos (Processo nº 1000628-74.2023.8.26.0160), cujo julgamento se deu em abril de 2025, que além determinar que o alimentante pague pensão alimentícia fixada em 30% de seu salário líquido (15% para cada filho) e custear o plano de saúde, também contribua com 50% das despesas de moradia dos filhos.
A ação foi proposta pelo escritório de advocacia Rodrigo Oliveira, que representou os menores. O sucesso no pleito reforça a possibilidade de o Judiciário reconhecer a moradia como parte integrante do dever de sustento, especialmente quando demonstrada a insuficiência da pensão para cobrir todas as despesas essenciais.
“A decisão proferida pela Vara da Comarca de Descalvado constitui um marco na garantia dos direitos dos menores, ao reconhecer que o dever de sustento, insculpido no ordenamento jurídico brasileiro, abrange não apenas a pensão alimentícia tradicional, mas também a responsabilidade compartilhada pela moradia digna dos filhos, em estrita observância ao princípio do melhor interesse da criança e à equidade entre os genitores“, salientou Dr. Rodrigo Oliveira.
Flexibilidade e o melhor interesse da criança
O caso de Descalvado ilustra a flexibilidade do direito de família brasileiro, que prioriza o melhor interesse da criança, conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, Lei nº 8.069/1990. Embora o Código Civil não imponha automaticamente a divisão de 50% do aluguel ou outras despesas de moradia, decisões como essa mostram que o juiz pode determinar tal obrigação quando as provas indicam sua necessidade e a capacidade financeira do alimentante.
O Superior Tribunal de Justiça – STJ, no Tema 192, consolidou o fato de que a pensão deve incidir sobre rendimentos como 13º salário e terço de férias, mas não há tema específico que verse sobre verbas indenizatórias, como FGTS e rescisórias.
Conclusão
A vitória obtida na Comarca de Descalvado destaca a importância da assessoria jurídica qualificada para garantir que os direitos dos filhos sejam plenamente assegurados. O precedente reforça que o pai pagante de pensão pode, sim, ser compelido a custear parte das despesas de moradia, como o aluguel ou financiamento, desde que isso seja essencial ao bem-estar dos menores e compatível com sua condição econômica. Trata-se de uma aplicação prática do princípio da igualdade de deveres entre os genitores, adaptada às realidades de cada família.
ABRIL 2025Categoria(s): Civil e Criminal/Novidades